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Quanto custa a política cambial brasileira?

29/10/2007

*Thomas Korontai

O Brasil experimenta um volume recorde de reservas cambiais – em torno de US$160 bilhões –, o que dá certa tranqüilidade ao mercado. Resta saber quanto desse montante pertence ao Brasil e quanto ao mercado, em especial aos especuladores que ‘freqüentam’ nosso país.

Todo estrangeiro que deseja investir em ações na Bolsa de Valores ou no mercado de capitais tem de trocar moeda estrangeira por real, no Banco Central. Se não tem reais, o Bacen emite para fazer a troca e para manter o nível do chamado meio circulante (quantidade de dinheiro no mercado), como também emite títulos de dívida pública para captar o volume que entender necessário em face dessas operações.

É evidente que o fluxo de capitais, mesmo especulativos, mais o fluxo de capitais provenientes das exportações – mesmo que centradas em commodities – gera efeitos positivos na economia, como em qualquer efeito dominó. É como o agronegócio: se for bem no campo, a cidade receberá os benefícios em reflexo continuado, afetando todas as demais cadeias produtivas.

O país só não ‘deslancha’, verdadeiramente, por estar travado pela carga tributária, carga burocrática, carga regulamentadora, carga de desconfiança – política e legal – tudo causado pelo alto custo das máquinas estatais nos três níveis, dentro de um modelo centralizador crônico e cada vez mais centrípeto, ampliando a incapacidade do estado que se arvora em quase todas as atribuições nacionais, estaduais e locais.

Resta apenas a confiança de viés macroeconômico e, talvez, para as grandes obras de infra-estrutura, embora elas sejam entre 70% e 80% financiadas pelo próprio BNDES, como no caso dos espanhóis, que venceram as licitações de 2.700 quilômetros em rodovias federais.

Está claro que o Brasil, então, vive uma nova ciranda financeira. Desta vez, cambial. Os lucros para os especuladores estrangeiros são excelentes, bem como para os investidores brasileiros. Ao que temos acompanhado nos noticiários, até o Banco Central ‘entrou na roda’.

Alguém falou em bolha? Ora, vivemos um momento que pode, sim, ser um balão especulativo, já que não há fundamentos sólidos para que a nossa economia garanta que os preços são sofram queda, que a inflação não seja elevada às alturas, que não haja qualquer flutuação no que se refere a exportação, emprego e renda. O ganho esperado de hoje pode se transformar em prejuízo amanhã. Faz sentido o governo brasileiro se endividar para se endividar em moedas?

Há empresários que dão como certa a crise de 2009, quando finalmente seremos atingidos pelo tsunami que teve origem nos Estados Unidos e Reino Unido este ano. Lá, o sistema de hipotecas imobiliárias, com longo prazo e juros baixos, seduziu muitos especuladores, que venderam a alma em troca de vantagens momentâneas. Não contavam que, uma vez instalada a desconfiança, o preço dos papéis seria derrubado. O efeito dominó se fez notar mais uma vez, exigindo intervenção imediata de vários bancos centrais, injetando capital no mercado a juros pouca coisa mais baixa, na tentativa de evitar a bancarrota generalizada. Isso sem comentar a eventual bolha gerada pelo volume crescente de crédito no Brasil (hoje em 33% do PIB), que colocou mais carros na rua e eletrodomésticos nas casas, mas ainda com juros escorchantes.

O Brasil, que copia tantos exemplos de fora, desta vez parece estar ligeiramente desavisado, seguindo sem dar conta de que pode vir a ser atingido mais adiante. Evidente que se preocupou com o impacto da economia norte-americana, destino de grande parte das nossas exportações e parceiro de negócios instalado nas terras verde-amarelas. Só que o governo não se deu conta de que está colocando a cabeça a prêmio e que pode vir a sofrer algo muito parecido com o episódio que abalou o sistema financeiro do hemisfério norte.

A riqueza dos Estados Unidos e da Inglaterra foi construída de forma sólida. Ainda que haja restrições, os percalços serão temporários. Certamente, como em outras épocas, eles vão se recuperar devido ao lastro da infra-estrutura econômica, social e institucional. O Brasil, infelizmente, ainda não goza dos mesmos privilégios. Quando os Estados Unidos espirram, o Brasil estica o lenço de papel, porque sabe que os reflexos de um, serão sentidos no outro, aqui. Não deveria ser assim, mas é.

Brasil e brasileiros só passarão a ter um pouco mais de segurança quando se empenharem na reorganização do modelo de estado, permitindo a descentralização, a ‘destributização’ das empresas e da cadeia produtiva, a desburocratização, a ‘descorruptização’ e a despolitização das relações governo-sociedade. Somente quando todos tiverem direito a produzir e competir, em nível mundial, será viável falar em diversificação e, então, teremos uma economia realmente sólida, não apenas lastreada em papel. Até lá, o Banco Central deve continuar a preservar nosso câmbio flutuante, para que, como o próprio nome diz, possa flutuar de acordo com as condições de mercado. ♣

*Thomas Korontai é presidente do Partido Federalista (www.federalista.org.br)
e autor do livro “Brasil Confederação” (Editora Pinha, 1993)

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